A CPI do
Cachoeira traz riscos para o governo e a oposição. Preocupados, os partidos
buscam acordos para minimizar os prováveis prejuízos da investigação 

Os parlamentares que integram a CPI do Cachoeira
reunidos no Congresso.
Cada grupo tenta restringir as investigações por
medo de suas consequências.
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investiga o bicheiro Carlos
Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, começou a definir seu rumo. E
ele dependerá dos limites impostos pelos partidos políticos, temerosos das
consequências da investigação.

Na semana passada, o PSDB planejava convocar o governador do Rio de
Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), para depor na comissão. Cabral tornou-se
possível alvo da CPI devido a suas relações próximas com a Delta Construções,
empreiteira cujos interesses Cachoeira defendia. Imagens de momentos de lazer
de Cabral na Europa ao lado do dono da Delta, Fernando Cavendish, divulgadas
nos últimos dias, não ajudaram a dissipar as suspeitas sobre o governador.
O tema, porém, é tratado com cuidado. Após uma reunião, líderes tucanos
deixaram o imbróglio Cabral para o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP). O PSDB
não quer enfrentar o PMDB, partido do governador fluminense. Os tucanos
precisarão da ajuda do PMDB para defender um de seus integrantes, o governador
de Goiás,¬ Marconi Perillo, suspeito de envolvimento com Cachoeira.
 Além do PSDB, o PMDB fez tabelinha com o PT. Os dois partidos conseguiram
empurrar para um futuro distante as convocações do governador do Distrito
Federal, Agnelo Queiroz (PT), e de Cavendish, para que deponham na CPI. Os
petistas tentam defender Agnelo e, mais importante, não querem dar espaço para
que a oposição investigue os inúmeros contratos da Delta com o governo federal.
Até antes da CPI do Cachoeira, PT e PMDB disputavam espaço no governo a
cotoveladas. Irritado com a criação da comissão num ano eleitoral, o PMDB
inicialmente indicou integrantes menos experientes para a investigação. PSDB e
PMDB também não andavam muito juntos. Mas poucas coisas são mais eficazes para
unir políticos adversários e formar alianças de ocasião que o risco de uma CPI.
Na CPI do Cachoeira, todos os partidos têm razões para ser agressivos, mas
acumulam outras tantas para a cautela. De maneira discreta, o senador Aécio
Neves (PSDB-MG) e o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, negociam com os
senadores do PMDB Renan Calheiros, José Sarney e Romero Jucá uma forma de
poupar Cabral em troca da ajuda a Perillo.
As investigações da Polícia Federal apontam diversas ligações entre
Perillo e Cachoeira. Perillo encontrou Cachoeira socialmente, recebeu-o no
Palácio do Governo e foi dono da casa onde Cachoeira vivia quando foi preso.
Mas acordos de paz dependem de armas na manga. O PSDB escalou para a CPI investigadores
como os deputados Fernando Franceschini, ex-delegado federal, Carlos Sampaio,
promotor, e o senador Álvaro Dias.
No front regional, o governador Perillo aproveitou sua maioria na
Assembleia Legislativa de Goiás e criou uma CPI estadual, controlada por seus
aliados. Se for atacado na CPI em Brasília, Perillo pode dar o troco em casa.
Entre os alvos estão seus adversários: os ex-governadores Iris Resende e
Maguito Vilela e os prefeitos petistas de Goiânia, Paulo Garcia, e de Anápolis,
Antônio Gomide.
Procurado pelo PSDB em busca de um acordo, o trio Sarney-Renan-Jucá dá as
cartas no Senado há anos. É verdade que sofreu alguns reveses recentes – o mais
grave deles, a destituição de Jucá do cargo de líder do governo no Senado.
Agora, o caminho acidentado da investigação pode lhes abrir diversas
oportunidades de recuperar poder. Uma delas é ajudar Cabral. Ele foi envolvido
no caso por ser amigo de Cavendish. A Delta recebeu cerca de R$ 1,5 bilhão da
gestão Cabral em cinco anos. A empresa de Cavendish é um dos centros da
investigação, devido aos milhares de gravações que explicitam como Cachoeira e
seu sócio, Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta no Centro-Oeste, discutiam
armações para promover negócios da empreiteira.
A proteção à Delta une PMDB e PT, seu parceiro por ofício, mas concorrente
na prática. Na semana passada, os dois partidos conduziram os trabalhos para
adiar a convocação de Cavendish. É inevitável que a Delta seja investigada. O
que PT e PMDB querem é limitar os danos. “Nossa preocupação com a Delta é
apurar desvio de dinheiro público”, afirma o senador Álvaro Dias (PSDB-PR). Os
petistas querem a ajuda do PMDB para blindar os contratos da Delta com o
governo federal. A empresa é a campeã de obras do PAC: já recebeu R$ 3 bilhões
por obras do programa. É também, há três anos, a maior fornecedora do governo
federal. Na semana passada, o Ministério Público Federal no Tocantins denunciou
Carlos Pacheco, o principal executivo da Delta, por uso de documentos falsos
para obter certidões do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA),
em Palmas. Em abril, ÉPOCA revelou que a papelada foi usada pela Delta para
obter dois contratos com o governo do Distrito Federal – que poderão render R$
472 milhões até 2015. Pacheco afastou-se da Delta há duas semanas.
Apesar da imagem de despreocupação da presidente Dilma Rousseff, o governo
tomou medidas para se precaver caso a Delta desmorone. Nas últimas semanas, a
Delta desistiu de grandes obras, como a reforma do estádio do Maracanã. O
problema maior está nas obras menores. A maioria é do Departamento Nacional de
Infraestrutura Rodoviária (Dnit) e teria de ser repassada a empreiteiras de
médio porte. Por isso, há uma articulação em curso para que outra empresa
compre a Delta. Segundo o jornal O Globo, o ex-presidente do Banco
Central Henrique Meirelles busca interessados na empresa.
A CPI do Cachoeira já mete medo porque começou ao contrário: parte de uma
extensa investigação feita pela Polícia Federal, não dos próprios
parlamentares. Como o que está lá já causou sérios estragos, ninguém quer mexer
mais no vespeiro. Por isso, quando surgiram as primeiras ligações do senador
goiano Demóstenes Torres (então no DEM, hoje sem partido) com Cachoeira, o
Senado se calou. Demóstenes defendeu-se na tribuna e foi aplaudido por 43
senadores, inclusive do PT.
Agora, os partidos precisarão de muito mais que aplausos em sua operação
de controle de danos.

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